bis
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entre a ciência e a coincidência
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estou no trabalho, ouvindo "Hunter", do Portishead (sob protesto sutil de quem está ao meu redor, ressalte-se), com preguiça de ir pra casa. pensando em duas coisas: cachorro-quente e se estou fazendo a coisa certa da minha vida. o sanduíche eu deixo pra daqui a pouco. a coisa certa da minha vida eu preciso saber antes de dar a primeira mordida.
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dez minutos se passaram. um caso eternamente mal-resolvido, uma dúvida profissional, "Alison" do Slowdive e o medo de chorar na frente do meu chefe. esqueço o assunto e vou conversar e aprender. é isso: só aprender, trabalhar, aquelas palavras que eu enfio a todo momento na minha cabeça, no blog, na minha vida fora daqui e em tudo o que faço. porque um dia há de entrar.
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fora isso, um agradecimento ao Felipe pela conversa de agora há pouco. valeu, chefe.
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nunca foi segredo pra ninguém que eu sou fã do tom galhofeiro-elitizado do Top Gear, tanto no programa de tevê quanto nos artigos da página dos caras - e nos do Jeremy Clarkson, então, nem se fala. a atual manchete da página dá o nível da coisa, na avaliação de uma série limitada do Porsche Boxster: "RS60: melhor do que sexo, diz Bill Thomas. Mas ele é ruim de cama".
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mais uma coluna antológica do João Pereira Coutinho, dessa vez publicada na Folha desta terça. tá virando rotina, mas o que ele escreve costuma triturar qualquer coisa que eu pense, qualquer inspiração para escrever aqui etc.
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Uma miss à minha porta
Foram anos e anos e anos em busca das mulheres mais belas. Não fui caso único. E poderia dizer, como um escritor beat decadente, que vi as melhores mentes da minha geração destruídas por ruivas de olhos verdes e morenas de cabelo negro. Mas uma loira genuína com a pele pintada a ouro? À minha porta? Ah, isso não é justo. Nem real. Tudo começou com uma oferta da senhoria. Eu, rapaz solteiro, com vida dissoluta, estaria interessado nos serviços de uma empregada doméstica três vezes por semana?
Contemplei as camisas por passar. Lembrei, com repulsa, a louça em forma de Everest na cozinha. Disse que sim. Sem entusiasmo. No dia seguinte, a empregada chegou. E antes de eu chegar a ela, um pouco de história, por favor. Leitores, o que aconteceu em 1991? Eu respondo: em 1991, a antiga União Soviética era sepultada. Ficaram apenas herdeiros festivos: russos, ucranianos, armênios, moldavos, lituanos. Uma salada. Os anos seguintes não foram fáceis: com o capitalismo à solta em solo virgem, as antigas repúblicas soviéticas caíram na inflação e na escassez e começaram a exportar gente para os quatro cantos da Europa.
Não falo apenas de gente pobre. Falo de gente que ficou pobre de um dia para o outro. Em qualquer cidade da Europa ocidental era possível encontrar advogados servindo em cafés ou antigos ministros trabalhando na construção civil. Cheguei a conhecer um médico moscovita que, depois da derrocada, era motoboy em Portugal. Já tinha visto de tudo. Mas nunca vira uma antiga candidata a miss fazendo limpezas. Chama-se Emma e, na década de 90, ela concorria ao título ucraniano. Perdeu, não me perguntem como. Depois, a família não agüentou a crise, Emma partiu com a irmã para Madri e finalmente aterrou em Portugal. Aterrou em minha casa.
Era Proust, creio, quem dizia que as mulheres bonitas eram para homens sem imaginação. Se Proust estava certo, então eu sou uma pedra em forma humana. Não, ela não é bonita. Ela transforma a capela Sistina em grafite urbano. Ela reduz qualquer escultura de Rodin a um monte de sucata. Os cabelos, longos, terminam onde começa um pescoço que faria as delícias de Bela Lugosi. Os olhos, de um azul como já não existe nos céus de Lisboa, sorriem mesmo quando ela não sorri. E, quando o sorriso acontece em lábios generosos e de um vermelho que dispensa qualquer pintura, o rosto ganha uma luz que pode levar qualquer homem à cegueira. O corpo é perfeito. Como sei? Pelos pés: pequenos, esguios, ligeiramente ruborizados. Ela trabalha descalça e gosta de caminhar como as bailarinas. Ou como os gatos. Silenciosa e nas pontas.
Começou no mês passado. Segundas, quartas e sextas. Achei melhor incluir também as terças. E as quintas. E depois o sábado. E o domingo. E o dobro do salário nos dias feriados. Oito horas por dia? Não. Doze. Na impossibilidade de serem 24. E nada de limpezas. Limpezas, princesa? Com essas mãos tão delicadas? Eu limpo, ela existe. E amigos vários, incrédulos ao início, já começaram a fazer excursões à casa como certos peregrinos a lugares sagrados. Chegam, acampam. Alguns pedem para levar uma relíquia da santa: um fio de cabelo, uma unha, um dente. (Um dente?) Eu sou como um policial em filme de Hollywood, depois de selar o local do crime. "Dispersem, por favor. Não há nada para ver."
Mas há tudo para ver. Imagens do concurso de miss, que ela mostrou em fotos da época. Algumas canções ucranianas, que aprendo a balbuciar com a atenção cirúrgica de um aluno aplicado. Troquei o uísque pela vodca. Experimentei arenque (que delícia! como foi possível acreditar que o bacalhau era o supremo peixe?). Também sou capaz de reproduzir os passos mais elementares de uma dança típica. E sem qualquer esforço, apesar das cãibras permanentes que me fazem gemer a noite toda. E já digo "bom dia", "boa tarde" e "boa noite" na língua retorcida dos nativos. Quando chegar a um nível mais profissional, resolvo tudo com um "casa comigo" e depois parto com ela para a lua-de-mel em Kiev.
Anos e anos e anos em busca das mulheres mais belas. Mas foi o fim do comunismo e a entrada arrasadora do capitalismo que trouxe uma miss à minha porta. E logo agora, que eu começava a ficar um pouquinho mais esquerdista. Desculpem, camaradas. Mas, como diria o velho Karl, a cada um segundo suas necessidades.
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ele traz, em uma parte do tempo, a cor vermelha (rosso) que batiza
esse post; ele traz, mais do que isso, a minha vontade de trabalhar,
quando esta se vai. é raro, mas acontece. da mesma forma, as fotos do
Jorge Paulo Lemann, do Eike Batista e da Lisa Cant, que adornam a
minha baia, têm o mesmo efeito: o de me fazer trabalhar e produzir
cada vez mais, tanto em benefício da Telerj quanto em meu próprio.
são 7:57 da noite e eu acabei de acabar tudo o que tinha que fazer por
aqui, tanto para a Telerj quanto para o Portal do Geólogo. estou um
pouco cansado, mas faz parte; em compensação, não acho que trabalhei
demais. não fiz corpo mole, mas é como o Alexandre diz: acordo todo
dia com a sensação de estar perdendo o jogo por 2x0, e nos melhores
dias durmo achando que consegui o empate.
umas duas horas atrás me deu vontade de chorar. um pouco porque estar
aqui na área nova é um sonho realizado, um pouco porque é apenas um
degrau dentre milhares de lances de escadas que terei de subir até
chegar onde quero.
um lado bom e um ruim.
ainda estou sem ritmo para o novo trabalho, por isso tenho a impressão
que tenho três vezes mais coisas para fazer do que tinha na outra área
- e não tenho. mesmo que tivesse, sempre poderia fazer mais: é o que
me move, é o que me faz acordar todo dia de manhã. mas de vez em
quando o corpo sente, a cabeça sente, o coração sente um aperto. e
olhando as fotos dessa gente que eu quero conhecer, olhando o letreiro
do Bradesco lá fora e tanta coisa para ser feita, eu só penso em me
recuperar mais rápido e não desanimar.
mas no final das contas eu não chorei, só fiquei com os olhos
vermelhos - e preocupado com o que diriam ao ver que eu, no meu
terceiro dia aqui e sem motivo aparente, estava assim. mas foi tão
rápido que não deu tempo de verem, foi tão rápido que mal deu tempo de
sentir alguma coisa. pensei em uma música que adoro e que diz "tell me
I'm not dreaming, but are we out of time?". eu não sei dizer e não
quero pensar no assunto, eu só quero voltar pra casa à noite e pensar
que o dia valeu a pena.
e é assim que eu tenho me sentido ultimamente.
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