segunda-feira, outubro 09, 2006

ontem já não existe mais

vi esse título numa entrada de outro blógue e gostei. precisava lembrar de algo assim pra encerrar bem o dia.

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sensações de limpeza não duram pra sempre. esfregue a superfície quantas vezes quiser, e um dia ela estará novamente coberta de pó. assim é a sua vida, sabia? a revolução precisa ser feita todo dia, as porradas têm de ser sentidas todo dia, os medos encarados todo dia. eu repito isso para mim com a intenção de não perder tempo: gasto um minuto para não perder vinte e quatro horas. pode chamar de manutenção preventiva, pode chamar de terrorismo psicológico, mas é a minha defesa contra a tendência natural de se acomodar. ontem já não existe mais, então o jeito é se concentrar em todos os hojes que tivermos.

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conservadorismo em excesso assusta. high hopes também. tenho acompanhado essa disputa pela Presidência como uma boa fonte de metáforas para a vida, anotando estratégias a serem seguidas, comportamentos a serem desmascarados, etc. e vejo como se comportam os assessores dos dois candidatos. não nasci para ser político: tenho nojo do assistencialismo que a parcela indolente dos pobres espera. só mudaria de idéia se o voto fosse facultativo e eu pudesse ser vice de alguém que não advogasse o populismo que reina abaixo do Rio Grande (aquele que separa os Estados Unidos do México, bem entendido).

dizia-se, na Guerra Fria, que a bipolarização era um trabalho de conquista de corações e mentes. quando eu era moleque, morria de medo da União Soviética. tremia só de pensar naquele país que pouca gente sabia. então eu fiz dez anos e eles se desmantelaram. cá estou, quinze anos depois disso, vendo que pouca coisa mudou. cada coisa que foi dita desde então passou a ter quatro ou cinco significados, às vezes até vinte e sete: os anos 1990 foram a década do cinismo e não há sinal de uma tendência de reversão desse processo. assim sendo, resta-nos aprender a viver nos tempos do cinismo, mas sem deixar que o medo da interpretação nos impeça de viver. é aprender a morrer para que tudo fique bem, como disse o Wilco.

pode ser que eu fosse muito jovem, na década de 1980, e ignorasse o cinismo então presente. mas ainda acho que isso é algo bastante recente e que, com a ascensão da minha geração ao poder, só vai piorar. conversando esses dias sobre imediatismo e relacionamentos, a Carol falou que a nossa geração vai morrer sozinha porque queremos tudo-perfeito-agora: não se há paciência, tolerância, progressividade. concordo. agora passe isso para o campo da política, por exemplo: não é difícil enxergar uma nova corrida armamentista, umas dúzias de destemperos a gerar problemas internos e externos, um engessamento da história. se um pessimista nunca está desapontado, é meu dever anunciar com orgulho: vai ser gente da minha geração, e não a do meu pai ou as próximas, que vai destruir o mundo - e a partir do cinismo.

apesar disso, eu não sou um cara saudosista. e não acho que seja a minha geração a que vai destruir o mundo: ela vai "apenas magoá-lo". porque não terá competência suficiente para destruir nada; apenas reduzirá tudo a pouco, tropeçando nas próprias pernas. magoar é pouco? não, de jeito algum*. mas a incapacidade de destruição será o atestado de que tentou-se fazer algo pior e não se conseguiu.

(* no original, "de jeito algum" era "nem a pau". por uma questão de modos, a expressão foi trocada. mas fazia mais sentido).

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post pesado, não? vamos falar de outras coisas...