domingo, abril 09, 2006

chamar isso de pizza é insultar a redonda
texto inspiradíssimo do Daniel Piza no Estadão de hoje (obtido por meio da newsletter do PFL):

Era Lula um astronauta?
Daniel Piza


Mais uma vez o governo federal se envolve numa série de atentados à lei e nosso presidente não sabia, não comenta e não cobra nada. O desrespeito às instituições democráticas pela camarilha petista reapareceu nas tentativas do ministro Palocci de colocar o réu em suspeita, à velha maneira bolchevique, em vez de responder às acusações com clareza e álibi. A operação suja-caseiro, que contou com ajuda ou consulta de diversas instâncias do poder central, foi feita a alguns metros do gabinete de Sua Excelência. Não é de estranhar, a propósito, que Lula saiba tão pouco da vida de seus filhos - eles sempre estavam no quarto ao lado. O pior é que o argumento continua a servir de desculpa mesmo depois que o País inteiro é informado dos delitos.

Como Al Capone sendo pego por sonegação à Receita em vez do comando de crime organizado, Palocci foi derrubado por mandar violar o sigilo de uma testemunha, não por ter montado a anti-republicana República de Ribeirão Preto num QG em Brasília. Mas as investigações e punições devem seguir impiedosamente. Que um ex-ministro obviamente saudável seja ouvido em casa por um delegado da Polícia Federal já é escândalo suficiente para que um presidente responsável se pronuncie. Que Palocci tenha também procurado apoio do Ministério da Justiça, dos arapongas da Abin e dos funcionários da Caixa Econômica Federal, entre outros comparsas, deveria ser motivo de limpeza geral. Que ele tenha permitido tantos esquemas de assalto ao dinheiro público, quando prefeito e quando ministro, aponta para a cadeia.

E o que fez Lula? Um discurso emocionado e elogioso, quase pedindo perdão por sua saída. Assim como no caso Waldomiro Diniz, quando não fez o que qualquer chefe de governo sério faria - afastar José Dirceu -, e no caso do mensalão, que menosprezou como caixa 2 que todo partido político teria no Brasil, ele se eximiu de suas obrigações. Tampouco tomou qualquer atitude a respeito das inúmeras tentativas do PT de interromper as apurações; não, preferiu convocar os acusados para reunião de desagravo em dependências do Executivo, fez lobby por votos contrários nas CPIs, jogou toda a culpa das transações com Marcos Valério nas costas de seus lugares-tenentes.

Quando Ângela Guadagnin fez aquela coreografia patética para comemorar a absolvição de um deputado petista, dançou por "nosso guru" também. Não duvido que Lula - o Jamanta ("Jamanta não sabe nada, Jamanta não viu nada"), como comparou Ignácio de Loyola Brandão - tenha tomado uma caninha em homenagem a João Paulo Cunha na quarta passada, depois de saber da absolvição do nobre deputado cuja mulher sacou R$ 50 mil do Banco Rural para pagar TV por assinatura. Afinal, mesmo que a tropa de choque vermelha não tenha conseguido emplacar relatório paralelo para evitar que a CPI registrasse o evidente - a transferência de dinheiro obtido em licitações públicas para a aliança de governo -, o auge dessa crise passou. Ninguém lúcido acredita que o esquema tenha se limitado a esse punhado de saques, e muitos outros culpados ficarão impunes. Chamar isso de pizza é insultar a redonda.

Pouco antes da absolvição de João Paulo, Lula tinha conversado em teleconferência com o astronauta Marcos Pontes. O oba-oba ufanista em relação a um se compara ao que o outro já teve. O mesmo privilégio no Jornal Nacional se vira ao vivo nas noites anteriores, quando William Bonner perguntou sobre o orgulho e até a espiritualidade de Pontes, que só soube responder clichês de novela ("Não para descrever", etc.). Lula, que antigamente achava esse tipo de gasto um desperdício num país com tantos miseráveis, citou Santos-Dumont, que era um inventor de gênio, e Ayrton Senna, um grande esportista e ídolo; Pontes nada inventa e nada conquista. Pode-se até argumentar que a participação de um brasileiro nessa missão quase irrelevante tem valor simbólico, mas, como notou Fernando Reinach, o dinheiro serviria para formar mais de 150 doutores. Se esse governo tivesse feito algo importante pela ciência e tecnologia, ainda poderia se dar ao luxo. Não fez.

No livro Eram os Deuses Astronautas?, Erich von Daniken defendeu a tese de que não só existem seres inteligentes em outros planetas, mas também que foram eles que trouxeram conhecimentos para a Terra. De Marcos Pontes não virá nenhum. Mas que Lula prefere se sentir em órbita, onde suas fantasias de fazer História não são contrariadas por tantas histórias ao seu redor, não resta dúvida. Ele já perdeu toda a noção de gravidade.